A beleza, mesmo a de um simples objeto, de uma flor modesta ou de um floco de neve, sugere todo um mundo; ela liberta, enquanto a feiura enquanto tal aprisiona; dizemos “enquanto tal” porque compensações podem sempre neutralizá-la, assim como, inversamente, a beleza pode, na prática, perder todo o seu fascínio. Em condições normais, a beleza evoca ao mesmo tempo a ilimitação e o equilíbrio de possibilidades concordantes; ela evoca assim o Infinito, e portanto, de uma maneira mais imediatamente tangível, a nobreza e a generosidade que dele derivam: a nobreza que desdenha e a generosidade que prodigaliza. Não há na beleza enquanto tal nada de mesquinho; não há nela nem agitação, nem avareza, nem nenhuma crispação de algum tipo.
O arquétipo da beleza, ou seu modelo divino, é ao mesmo tempo a superabundância e o equilíbrio das qualidades divinas e o transbordamento das potencialidades existenciais no Ser puro; num sentido um pouco diferente, a beleza resulta do Amor divino, o que quer dizer que o Amor é a vontade de se desdobrar e de se dar, de se realizar num “outro”, e é por isso que “Deus criou o mundo por amor”. O resultado do amor é uma totalidade que realiza um equilíbrio perfeito e uma beatitude perfeita, e que, por esse fato, é uma manifestação de beleza, a primeira a ser e aquela que contém todas as outras, a saber, a criação, o mundo, o qual, em seus desequilíbrios, contém a feiura, mas que é beleza em sua totalidade. Essa totalidade, a alma humana só a realiza na santidade.
Schuon, Lógica e Transcendência, Ponte Editora, 2023.