Krishna e as gopis: uma das formas do amor a Deus.

Uma sociedade não apresenta nenhum valor em si mesma ou pelo simples fato de sua existência. Disso resulta que as virtudes sociais não são nada por si mesmas e fora do contexto espiritual que as orienta para nossos fins últimos. Pretender o contrário é falsificar a própria definição do homem e do humano.

A Lei suprema é o perfeito amor a Deus — amor que deve engajar todo o nosso ser, segundo a Escritura — e a segunda Lei, a do amor ao próximo, é “semelhante” à primeira; ora, “semelhante” não significa “equivalente”, nem, sobretudo, “superior”, mas “do mesmo espírito”: Cristo quer dizer que o amor a Deus se manifesta extrinsecamente pelo amor ao próximo, onde há um próximo, ou seja, que não podemos amar a Deus odiando nossos semelhantes.

Em conformidade com nossa natureza humana integral, o amor ao próximo não é nada sem o amor a Deus, ele tira todo o seu conteúdo desse amor e só tem sentido por ele; por certo, amar a criatura é também uma maneira de amar o Criador, mas com a condição expressa de que sua base seja o amor direto a Deus, sem o que a segunda Lei não seria a segunda, mas a primeira; ora, não se diz que a primeira Lei é “semelhante” ou “igual” à segunda, mas que esta é igual àquela, o que significa que o amor a Deus é a base necessária e a conditio sine qua non de toda outra caridade.

Esta relação transparece — por vezes de maneira imperfeita, mas sempre reconhecível quanto ao princípio — em todas as civilizações tradicionais.


Frithjof Schuon, O Homem no Universo, Editora Perspectiva, capítulo “Sobre os mundos antigos”.