
“Sentir uma doença é não mais tê-la”, dizia Lao-Tsé. O que quer dizer que o remédio contra um mal está na consciência que temos desse mal; o remédio é dado por essa própria consciência.
Antes de mais nada, quero lhe dizer duas coisas: em primeiro, que o senhor não tem nada a temer; e, em segundo, que a provação pela qual o senhor passou foi providencial; o que aconteceu com o senhor devia lhe acontecer, e isso para o seu bem. Pois o senhor tinha demasiada autoconfiança e, por esse fato, não tinha suficiente prudência; o senhor tinha demasiada curiosidade intelectual, sem ter suficiente fé; demasiado senso crítico, sem ter suficiente senso das proporções.
O aurobindismo é uma heresia satânica, como o teilhardismo o o gurdjieffismo, e há que se afastar dele como da peste. Não é necessário que eu entre nos detalhes dessa ideologia demencial e propriamente infame; do ponto de vista intelectual, é uma das filosofias mais tolas que existem; Shrî Râmana Maharshi ria-se dela quando lhe falavam a respeito.
Evidentemente, o senhor sofreu uma influência psíquica maléfica, mas isso não deve assustá-lo, apesar dos seus sofrimentos, pois uma influência como essa é contingente, enquanto que o Mantra vem do Absoluto (…) [aqui são dadas recomendações relativas ao método espiritual].
(…) E é preciso realizar a santa monotonia, a santa pobreza, a santa infância; sabendo que conhece os princípios essenciais da metafísica, o senhor deve se manter no pequeno jardim do japa [*], sem curiosidade e sem nenhuma ambição.
O senhor me pergunta, em sua carta, se a sua interpretação do satanismo aurobindista é correta; ela é totalmente exata; trata-se de um evolucionismo no qual o homem se faz, na prática, Deus. O encontro com essas trevas foi para o senhor, repito, uma experiência providencial; não se arrependa dela, e diga a si mesmo que ela tinha que acontecer para que o senhor seja curado para sempre de certas tentações e de certos perigos de sua natureza. Pensarei no senhor em minhas orações.
[*] Japa: a invocação metódica de um Nome divino ou de uma Fórmula sagrada, em sua terminologia hindu. Essa invocação deve ser feita somente sob a direção de um mestre espiritual ligado a uma corrente tradicional autêntica (nota do editor.)
Frithjof Schuon, carta de 19 de maio de 1978 a um correspondente hindu. Extraída de Vers l’Essentiel – Lettres d’un Maître spirituel, Editions Les Sept Flèches, Lausanne, 2013, pp. 157-158. Tradução do original francês.